Estudo
da The Lancet mostra aumento de 50% nos anos vividos com doença ou
incapacidade e médico brasileiro analisa os impactos silenciosos desse cenário
sobre sistemas de saúde e estilo de vida
Apesar
dos avanços da medicina e do aumento da expectativa de vida, o mundo está
envelhecendo mais — mas nem sempre melhor. Entre 1990 e 2017, o número de anos
vividos com doença ou incapacidade aumentou 50%, segundo estudo
publicado na revista científica The Lancet (Global Burden of Disease Study 2017),
em parceria com a Fundação Bill e Melinda Gates.
A
análise avaliou 354 doenças e lesões em 195 países e apontou que, em 2017, o
mundo perdeu 853 milhões de anos de vida saudável,
em comparação a 562 milhões em 1990. Isso representa uma piora de 7,2% na saúde
global ajustada por incapacidade.
Para
o neurologista e PhD Dr. Paulo Rogério Mudrovitsch de
Bittencourt, que atua há décadas com doenças neurológicas
crônicas e longevidade funcional, o dado mais importante do estudo é a
constatação de que a medicina moderna tem prolongado a vida — mas não
necessariamente preservado sua qualidade.
“A
saúde pública deixou de pensar só em mortalidade e passou a considerar a
incapacidade. Hoje, vivemos mais anos, mas em muitos casos, vivemos com dor,
limitação física ou distúrbios mentais. Isso tem custo humano, social e
econômico elevado — e que está aumentando”, explica.
Os
vilões da qualidade de vida
As
principais causas de perda de anos de vida saudável identificadas no estudo
foram:
Lombalgia
crônica
Cefaleias
recorrentes
Transtornos
depressivos
Deficiências
nutricionais e doenças bucais
Essas
condições foram responsáveis por 162 milhões de anos perdidos com incapacidade
em 2017 — o equivalente a 1 em cada 5 anos vividos com limitação no planeta. E,
segundo Dr. Paulo Bittencourt, o mais alarmante é que “são doenças tratáveis e de baixo
custo. Mas continuam crônicas, mal geridas e subestimadas”.
O
declínio das Zonas Azuis
O
estudo também provoca uma reinterpretação das chamadas Zonas
Azuis — regiões com alta concentração de centenários
saudáveis, como Okinawa (Japão), Sardenha (Itália) e Nicoya (Costa Rica). Dados
mais recentes indicam deterioração progressiva da saúde
nessas áreas, principalmente entre as gerações mais jovens.
“As
populações mais longevas do século XX nasceram em tempos de escassez. Eram
ativas, jejuavam por necessidade e tinham uma dieta natural. Hoje, seus
descendentes cresceram no conforto, com fast food e vida sedentária. Isso
reverteu os padrões que antes geravam saúde”, comenta o neurologista.
Alerta
para o futuro: a epidemia silenciosa do século XXI
Dr.
Paulo Bittencourt alerta ainda para possíveis reflexos dessa transformação na
infância e adolescência.
“Há
uma explosão de diagnósticos de TDAH e autismo em faixas etárias que antes não
apresentavam esse perfil. Isolamento social, excesso de telas, sono ruim e
alimentação ultraprocessada podem ser parte da causa. Ainda não aparecem nas
estatísticas da OMS, mas pode ser uma questão de tempo.”
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